sexta-feira, 13 de junho de 2014

CICATRIZ











As cicatrizes que trago rarefeitas
são escrita que a minha boca calou,
embalsamadas no corpo erguido
como pedra basáltica do coração,
que não vejo.
Viajo meu sonho alucinante
do qual me desperto
quando a rolha da felicidade salta
e o abismo se abre a meus pés,
em corolas de dores perfumadas,
pétalas de lágrimas que caiem
no chão desgastado como velho
e varridas pelo vento como brasas
do inferno.
E que vejo eu?
O peito retalhado onde o sangue é despeito,
o queimar dos sentimentos
que desejo,
o vergastar da crueza que rejeito,
a sombra da solidão que cai como crepúsculo,
traçando no meu céu etéreo e aberto
como meteoro;
a cicatriz no coração!




Jorge d'Alte


terça-feira, 3 de junho de 2014

O PESADELO DO DESESPERO







Quantas esquinas dobradas,
quantas marcas guardadas,
portas sem aldrabas, janelas fechadas…
com vidraças foscas e rachadas
onde a sombra do sonho se esmagara como mosquito
esborrachado.
E o rosto desfigurado sem o saber,
corroído por estranhas aranhas nas entranhas
a tecer rosários e teias de ódio e fúria.
Ah! Pois....
e ciúmes disfarçados, ainda a noite ia pequenina.
Se estrelas houvera, caíram ali mesmo!
Até a lua era meia de meia
como cagadela de mosca na lâmpada que luzia.
Mas também quem queria essa lua?
Não dizem que é dos amantes?
(Então que fiquem com ela e que forniquem)
Amor era coisa arredada daquela vida.
A mágoa infiltrava-se pelas rachas da alma
abrindo feridas com palavras de gume afiado,
como o machado que racha a lenha de cima a baixo,
e separa.
Corpo seco talhado a golpes de arte, era ele
do tira ali e põe de parte
e as goivas iam cortando meias luas de sentires
incubos dos pesadelos, sucubos na luxúria.
O pontapé dado na cadeira virada
(Escape grosseiro do danado)
trouxe espantos, nos ais que se seguiram.
Queria que a rosa esmagada, antes bela e carminzada
tivesse sido a gota de juízo que faltava,
mas o mundo virara tudo do avesso.
Os joelhos rasgavam-se nos meandros do desespero, dele.
A súplica arrastava-se na terra esgravatada e arranhada
e as unhas partiram-se ensanguentadas
na pedra polida, branca e gelada.
Era coisa que se fizesse?
Mas fora feito no auge emocional do desespero – desculpas!
Afinal quem o mandara amar?
Ela mulher talhada no gelo fechara-se na concha do belo
e não desceu do pedestal enfastiada com tanto degrado.
Quem seria esta intrometida? (era ele o pensativo)
Nem na mão estendida pegara,
nem carinhos de andorinhas chilreantes
cantadas ao ouvido, houvera. Nada, foi tudo o que esta lhe deu,
mulher da vida, rameira da amizade,
onde o sentir dos sentimentos entorpeceu.
Ionona evolada como véu de violeta rendado da névoa,
era o limite do olhar com limoselas florescendo nos cantos
e o “dentro” chorava as dores do mocetão.
Mas afinal para onde tinham ido as estrelas?
(Não estavam neste céu, não!)
A noite espraiava-se na bela aurora que trazia o novo dia.
O pesadelo iria pôr-se para lá do sono em brumas de memória.
Esquinas, marcas, portas e janelas… vidraças…
Mas que foi feita dessa estrelinha de magia?
Essa companheira de estrada…essa bolinha de algodão doce
de multi-sabores?
…Pois partira um dia como trigueira ceifada!
Ai dor dorida que queimas as entranhas. Vai-te maldita!
Só o sonho a pode trazer de volta, figura de gás que não se toca,
Apenas se inventa no desejo!

 “A desejada estava ali enterrada, ossos descarnados de mulher
roídos já pelo tempo, farrapos daquilo que fora outrora,
num céu azul de pássaros amarelos e borboletas de primavera;
Uma Rosa encarnada no meu jardim! ”


Jorge d'Alte