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sexta-feira, 27 de abril de 2018
DOR
Disseram-me que o relógio parara
Que não havia chegadas nem partidas
Apenas meio disto, daquilo e de aqueloutro
de um sonho que não sonhara
Pestanejei nas lágrimas sentidas
roído e quebrado como um qualquer outro
Senti-a chegar envolta em algodão
pareceu que me beijara algures entre a face e a boca
Senti o seu amor no perdão
Senti a vida fiando na roca
na palavras que me imaginei dizer
Vi-a ali sorrindo para mim
O relógio tiquetaqueou tremulo para te perder
vi-me de novo infernado, numa dor sem fim
Jorge d'alte
terça-feira, 24 de abril de 2018
CHEGADA DA MORTE
Os prantos caíram no proscênio
mesmo antes do suspiro fatal
A doença agarrara o corpo, definhando-a
mirrou-a e moldou-a como gênio
já na primavera depois do natal
Não houveram prendas de desejos alegrando-a
Nem de chilreios de andorinhas, nem flores abrindo
apenas a dor da saudade carpindo.
Jorge d'Alte
segunda-feira, 23 de abril de 2018
RAIVA
As ondas alterosas
invadem a minha costa
e na sua revolução
deixaram pedras e areia
e a espuma raivosa da emoção
em correntes perigosas.
Não contente enviaste
ventos uivantes e ferozes
que me fizeram estremecer
mas não vacilei não verguei
apenas ali te olhei
ondulando no pesar do esquecer.
Deixei de ouvir essas vozes
histerismos de que ninguém gosta
como fogo que se ateia
arrancando dores em feridas abertas
pus danado que em mim libertas
neste coração que um dia amastes.
Jorge D'Alte
sexta-feira, 20 de abril de 2018
DEMÔNIOS
Olhei o céu negro varrido de estrelas e
luares
Apenas nuvens cheias como seios túmidos a
pairar
Lábios secos como fonte que jorrou até secar
Não beijam a madrugada
Não trazem alvorada
Nem as lágrimas de alegria
E os demónios cá dentro sarnando a todo tempo
picam memórias sem ritmo talhadas como
destino
Abraçam o desespero tragando o novo dia que
não há
Trazem mágoas como vento lamento do que sinto
E esses demónios cá dentro esses demónios que
invento
São soro que me dá vida
Que injecta na veia ferida
A bestialidade perdida da vontade de querer
Olho os céus despidos de estrelas e luares
Nus de cinzas sombras do que ardeu
Digo a esse vento tonto que teima em soprar
- Tenho que a deixar partir!
Esse éden sem fio onde escondo do teu ver
É onde os demónios se escondem; malditos
Decompondo o meu ser num desejo de não ser
É muito escuro cá dentro sem a tua vívida centelha
Esse arder que se apagou num estralejar de
dedos
E como vermes a roer
São demónios que trago comigo desde a
alvorada ao entardecer
E na noite que sobra varrida sem estrelas e
luares
Sem túmidas nuvens nem nus de ti para afagar
Os demónios renascem, os demónios que invento
Os demónios que escondo
Frustrações mágoas sentimentos e saudade.
Jorge d'Alte
terça-feira, 17 de abril de 2018
MEMÓRIAS
Galos que não acordam madrugadas
Juventude que encolhe e mirra
Ossos que choram, doem e moem
Que gemem as agruras de uma vida
Que dedilham notas como passos
Passos que envelhecem com calçadas
Onde se escreveu as memórias
Jorge d'Alte
quinta-feira, 12 de abril de 2018
PESADELO DO DESESPERO
Quantas esquinas dobradas,
quantas marcas guardadas,
portas com aldrabas, janelas cerradas…
com vidraças bolorentas foscas e rachadas
onde a sombra do sonho se esmagara como
mosquito
esborrachado.
E o rosto desfigurado sem o saber,
corroído por estranhas aranhas nas entranhas
a tecer rosários e teias de ódio e fúria?
Ah! Pois....
e ciúmes disfarçados, ainda a noite ia
pequenina?
Se estrelas houvera, cairiam ali mesmo!
Até a lua era meia de meia
como cagadela de mosca na lâmpada que luzia.
Mas também quem queria essa lua?
Não dizem que é dos amantes?
(Então que fiquem com ela e que forniquem ao
desafio)
Amor era coisa arredada daquela vida!
A mágoa infiltrava-se pelas rachas da alma
abrindo feridas com palavras de gume afiado,
como o machado que racha a lenha de cima a
baixo,
e separa.
Corpo seco talhado a golpes de arte, era ele
do tira ali e põe de parte
e as goivas iam cortando meias luas de
sentires
incubos dos pesadelos, sucubos na luxúria.
A fúria no pontapé dado na cadeira virada
(Escape grosseiro do danado…)
trouxe espantos, nos ais que se seguiram.
Queria que a rosa esmagada, antes bela e
carminzada
tivesse sido a gota de juízo que faltava
Mas o mundo virara tudo do avesso!
Os joelhos rasgavam-se nos meandros do
desespero, dele.
A súplica arrastava-se na terra esgravatada e
arranhada
e as unhas partiram-se ensanguentadas
na pedra polida, branca e gelada sob a sombra
da cruz.
Era coisa que se fizesse?
Mas fora feito no auge emocional do desespero
– desculpas!
Afinal quem o mandara amar?
Ela mulher talhada no gelo fechara-se na
concha do belo
e não desceu do pedestal enfastiada com tanto
degrado.
Quem seria esta intrometida? (era ele o
pensativo)
Nem na mão estendida pegara,
nem carinhos de andorinhas chilreantes
cantadas ao ouvido, houvera. Nada, foi tudo o
que esta lhe deu,
mulher da vida, rameira da amizade,
onde o sentir dos sentimentos entorpeceu.
Ionona evolada como véu de violeta rendado da
névoa,
era o limite do olhar com limoselas
florescendo nos cantos
e o “dentro” chorava as dores do mocetão.
Mas afinal para onde tinham ido as estrelas?
(Não estavam neste céu, não!)
Aqui chorava-se dor! A amargura e a mágoa
vieram depois
Juntaram-se á saudade que ficou
Nos olhos erguidos só o negrume gélido sem
calor de alma
A noite espraiava-se na madrugada que traria o
belo amanhecer
O pesadelo iria pôr-se para lá do sono em
brumas de memória.
Esquinas, marcas, portas e janelas… vidraças…
Mas que foi feita dessa estrelinha de magia?
Essa companheira de estrada… essa bolinha de
algodão doce
de multi sabores?
…Pois partira um dia como trigueira ceifada
na alvura da vida!
Ai dor dorida que queimas entranhas. Vade retro
maldita!
Só o sonho a pode trazer de volta, figura de
gás desenhada que não se toca,
Apenas se inventa no desejo!
“A
desejada estava ali!
Enterrada…
Ossos descarnados de mulher menina roídos já
pelo tempo,
Farrapos daquilo que fora outrora e a fizera
num céu azul de pássaros amarelos e
borboletas de primavera;
(Vá-se lá saber porquê)
Uma Rosa encarnada no meu jardim! ”
Jorge d'Alte
terça-feira, 10 de abril de 2018
CAÍRAM NOITES
Caíram noites sobre noites e dias de luz e
outros não
Houveram madrugadas sem nome e ventos que
trouxeram tempos
Foram-se e não vieram como água que passa sob
a ponte
Da enxurrada do passado vergo os ombros até
mais não
Peso anos desde então desde o primeiro grito como
fonte
Encontrei caminhos verdes ou áridos e felizes
momentos.
Jorge d'Alte
terça-feira, 3 de abril de 2018
SURF
Longe varrem os meus olhos sedentos,
o espelho mágico troa na areia
em pequenas ondas baloiçadas no vaivém.
Escorrego a ladeira que me comicha os pés com
fina areia,
inspiro esse aroma forte da maresia
a brisa que sopra passa rápida a ventania.
As ondas iradas de profanos, rugem agora
alterosas intimidando.
O meu sorriso fica ali,
enquanto espeto na areia espumada, a ponta da
minha prancha.
Num desafio visto novo corpo de borracha
...sim não desisto...
a razão puxa-me para trás, mas a vontade
avança,
a água passa apressada gritando-me
desatinada,
tentando empurrar-me para trás,
e a onda enfurecida, esmaga-se perdida em
cima de mim.
Braçadas levam-me vogando na prancha no p’ra
lá,
ufano ultrajo esse mar, desafiando-o agora a
me tragar.
A resposta vem rápida na onda que nasce,
viro as costas à desgraçada,
os braços movem-se com firmeza lançando-me.
Erguido sinto o vento incentivar-me,
meus pés deslizam juntos com a prancha,
e na crista da onda lá vou ziguezagueando na
bolina,
abrigado me recolho no túnel que me
garrotilha...
é a loucura, é adrenalina no corpo meio encolhido.
O súbito, traz-me a luz que recorta a minha
silhueta no contra luz
garboso.
Deslizando na pouca velocidade afundo-me na
água vencida,
que num turbilhão me deposita de novo, na
tenra areia molhada,
como herói de fantasia...
Jorge d'Alte
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