quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

O NOVO ANO

 

A festa estava ali no ar 
No estralejar de luz e cor
Nas taças de tons quentes, erguidas
No murmúrio das promessas repetidas.
Tu, eu e muitos muitos
Sorvíamos essa alegria 
Que descia em cores garridas
Até se esfumarem dentro dos nossos olhos.
Vozes como que rezando
Desciam na contagem no segundo menos.
No meio segundo mais
O novo Ano acordara. 
No intimo de muitos muitos
A desconfiança grassava
As passas corriam mãos, nos desejos desejados.
No intimo de muitos que não eram muitos
A incerteza cortava a direito
Que futuro nos terá reservado?


Jorge d'Alte

quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

A CANÇÃO DO BUZIO

 


Escuto a canção do buzio
O seu chamar sem pranto dorido
O tempo ali guardado e perdido
O rolar preguiçoso sem laivos de cio
Das ondas mortas sem destino.
A voz perdi-a no norte
Congelada, crua, sem tino
Talvez prenúncios da velha morte.
Sim!
O olhar sabia por fim
Que o altar da vida era uma simples canção
Entoada na madrugada e definhando na tarde sem cor
Nela cantei versos de amor, sofrimento e dor
Nela construi o meu mundo risonho em forma de pão.


Jorge d'Alte


 

terça-feira, 29 de dezembro de 2020

OLHOS


 

Amarrados no frio que esmaga o peito
Os olhos verdes da cor dos trevos
Selvagens, avassaladores, devoram a cor
Com que respiram para lá das memórias
Num tempo sempre infinito.
 
 
Jorge d’Alte
 

PERDIDA

 

 


 

 

No longe os passos eram ecos sem retorno.

A alma resignou-se amarfanhada na sombra caída.

Recortada na quadratura da janela,

a silhueta sentada sem vivo rosto,

incendia a chama efémera, da Esperança.


Jorge d'Alte

 

 

 

 

 

 


 

 

segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

VIDA


 

 

 

A vida é uma corrida de obstáculos
onde constantemente tropeçamos,
numa luta desigual até à meta
onde absorvemos e saboreamos
a felicidade.


Jorge d'Alte
 

quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

A MÁGICA ILUSÃO DO PAI NATAL

 



Oh,oh,oh! 
Cantarolava o Pai Natal no seu trenó
Deslizava na pena neve que  se desfazia
Atrás de si o saco mágico ia deixando cair a sua prendinha
Junto do pinheiro, na aldeia fria ou na cidade branca
os olhos eram bocas abertas osculando a ilusão
deixando  só, um menino Jesus deitado.


Jorge d'Alte

quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

AVÒS

 



Junto da lareira aberta
de labaredas crocantes  e pés nas brasas
Os avós comiam a sua Ceia de Natal.
Pão escuro com alheira, ou presunto com queijo.
O vinho de sangue aquecia por dentro os gelos dos anos passados.
Perto um ramo de pinheiro suspenso do gancho
com fotos dos netos e sorrisos dos filhos.


Jorge d'Alte

segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

NATAL

 


Olhos subiam ao céu em bocas abertas

Em beijos de espanto

Em mãos entrelaçadas de preçes agarrando,

a oração.

A estrela brilhava agarrando as almas

Ancoradas na Fé,

E muitas foram as que caminharam juntas

Na fé do menino que se tornou homem

E nos resgatou do pecado através da morte.

A estrela está de volta milénios passados

Brilhando no céu doce

Deixando os meus olhos, dois mil e vinte anos atrás.

 

 

Jorge d’Alte

 

 

 

 


A ESTRELA

 

Olhos subiam ao céu em bocas abertas

Em beijos de espanto

Em mãos entrelaçadas de preçes agarrando,

a oração.

A estrela brilhava prendendo as almas

Ancoradas na Fé,

E muitas foram as que caminharam juntas

Na fé do menino que se tornou homem

E nos resgatou do pecado através da morte.

A estrela está de volta milénios passados

Brilhando no céu doce

Deixando os meus olhos, dois mil e vinte anos atrás.

 

 

Jorge d’Alte

 

 

domingo, 20 de dezembro de 2020

O MENINO

 


O verde pinheiro
De pequenas pinhas
Abanava seus ramos
Na ligeira brisa.
A neve como dinheiro
caia doentia como tramos
em prendas e prendinhas
depositadas na toalha bordada.
De joelhos olhava fascinado 
o menino deitado
e orei.


Jorge d'Alte

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

ENFIM PAZ

 


Ela chorava sozinha
lágrimas de intensa dor
e chorando era tão bela
iluminada pelo alvor
da matinal névoa que a emoldurava
qual abraço de ilusão
soltou um grito de revolta
por tanta criança morta
em pedaços pelo chão....
Levantou alto os seus braçitos
no seu pranto no seu delírio
pediu poder de ressuscitar
pediu que fosse um mau sonho
que acordasse deste martírio.
Lampejando no espaço
ferro ardente encheu seu peito.
Seu rosto enegrecido outrora tão belo
apagou-se como luz que se esvaece
No seu peito um último arfar
nos seus olhos um último brilhar
Seus níveos lábios então gritaram
um último sussurrar....
Enfim Paz!


sábado, 12 de dezembro de 2020

VOANDO

 



Voando nas asas do meu sonho
vi um rosto lindo de mulher
que com lábios rubros me sorria
ai feitiço que me cativou.
Por ti um gozo na vida
com doce sabor no coração
afeição nunca sentida
bem fundo cavou seu lugar
qual punhal me ferindo

Voando no dorso agitado
deste sentir em tropel desenfreado
chorei nos teus seios por amor
ai feitiço que me cativou.
Com doces fadigas de paixão
sulquei este céu
ó magica estrela
e em agonia tormentosa
me encontrei perdido neste suspiro
que do peito junto aos lábios veio morrer....


Jorge d'Alte


quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

JÁ NÃO SEI


Já não sei o que fazer
já nem sei quem eu sou
estou preso numa floresta
de sonhos, pensamentos,recordação.
Tenho saudades dentro de mim
na minha alma, em cada lágrima
tenho saudades tenho,
tenho saudades sim....
Só porque uma vez me sorriste,
só porque uma vez me chamaste
nos meus sonhos vejo-te minha.
nos meus sonhos tu me amaste
Fugi então e escondi-me
inventei luxo e disfarcei-me
deixei de pensar e sentir
de te chamar e sorrir.
Perdido estou algures neste lugar
que não é teu nem meu
que fazer então para escapar
do teu fogo que me perdeu?
Já não sei o que fazer
já não sei onde estou
preso dentro desta névoa
de sonhos, pensamentos, recordação

jorge d'Alte

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

QUANTA DOR

 


Ó quanta dor
Encontrei no teu olhar
Quando me disseram
Que a morte te viera buscar
Um silencio vazio
Encheu o teu peito
Quiseras tu ser rio
Murmurando na ravina
Dizendo-me deste jeito
Que a morte está tão viva.
Uma lágrima correndo
Solta pela dor
Quiseras tu ser vento
Afagando com ardor
minha face ardente
com o rito do amor
pontada agreste e doce
nos teus sonhos voando
pequena estrela que tu fosses
nas minhas recordações brilhando
todos os dias ao entardecer
até que a morte  te viesse trazer.
Ó quanto amor
Encontrei no meu chegar
quando te disseram
que a morte me viera buscar
Um silencio vazio
abraçou o meu peito
como suave brisa
murmurando na lezíria
dizendo-me deste jeito
que a morte nos unira…


Jorge d'Alte

Ano 1989

segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

MODELO

 


Olhos meigos que o mel adoça
Corpo elegante, sorriso risonho
É assim que te vemos ó linda moça
Mas sempre e sempre perseguindo o sonho.
 
É ser modelo o sonho dela
É vê-la sonhando com a passarela
Passo decidido, movendo-se com elegância
Lá vai ela vogando airosa na sua fragrância
Que nos envolve, nos cativa, nos prende em magia
Lá vai ela de cabelo ao vento
Levando nos sonhos um só pensamento
De ser modelo, um dia!


Jorge d'Alte

Ano 1990

CONHECI A PRIMAVERA

 


Conheci hoje a primavera,
estava sentada e vestia o verde da serra.
Seus lindos cabelos eram azuis,
e dos seus olhos de fogo nascia o sol.
As suas mãos suaves, eram libelinhas,
que se moviam afagando as flores.
O seu sorriso era feito de luar,
e a sua voz de rouxinol.
Mas chorava orvalho
que caía, que rolava, que se ia
que se esfumava....
Conheci a primavera no dia em que partia.


Jorge d'Alte

(Ano 1990)


domingo, 6 de dezembro de 2020

CHUVA

 

A chuva bate-me no rosto
varrendo no vento que sopra
lágrimas que um dia gritei
E no eco que não chega
ardo em saudades
do fogo que morrera
nesse entardecer.
As ruas despidas assumem-se na vida
como refugio que percorro
tentando encontrar nas sombras perdidas
algures, a ponta do teu fogo
A chuva batida fustiga meu corpo
desfazendo-o aos poucos em soluços sem solução
Escuto no desvario palavras escritas
que como papel não lido, amasso no coração
A lua que era então, já não é luz nem som
apenas restou o esboço do seu rosto nessa bruma
e os passos nus que lá vão 
marcam na vida passos de solidão
A chuva escorre agora como lágrimas caídas
como caída se sente a alma na nuvem corrida
E por mais que eu sonhe, a tua canção se perdeu
apagada de um fogo que vacilou e morreu.
A chuva alagada agora em poças de lama
moldou neste barro o meu coração
e num gesto de ternura
abriu sua mão e deu-lhe outra chama.


Jorge d'Alte  
(letra 2010)

sábado, 5 de dezembro de 2020

MEMÓRIAS TRISTES

 

Com as lágrimas voando ao meu lado
correndo atrás da tristeza
ritmando angústias e saudades como fado
hiato, ode gritante de incerteza.
Sio neste ar de sol de meio
sem ser andorinha, águia, ou gaio
sendo apenas o bico deste seio
com lábios que me trespassam como raio.
Não sei se foi em camas de trevos e rosmaninho
ou em raízes retorcidas que me amarram.
Fiquei nu no silêncio do teu ninho,
gemido efémero no oco do vazio, que narram,
noites de langores e tremores idos,
amores,sabores, no tempo desfeitos, perdidos.


Jorge d'Alte








quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

COMO TE ODEIO

 




Como te odeio!
Vejo a tua sombra pairando,
tenebrosa sobre mim.
Teus olhos me devoram!
Tuas garras me afagam!
O carinho incendeia-me
Ai como te amo!
Gosto de ti no escuro da noite!
Desejo expectante, que me afastes as pernas
E aí, eu grito silenciosa, o meu amor
Quero mais e mais deste ardor
Puxo por ti!
Quero-te meu!
E no final deste incêndio, penso
Como te odeio meu amor!
Como gosto de ti meu estupor!
Já não sei o que fazer!
Já não sei o que querer!
Mas longe de ti …não!!
Porque te odeio para sempre
E não te quero perder
Meu amor!
 

LIBERTEM AS CRIANÇAS

 


Libertem as crianças!
Deixai-as  ser terra, verdura, areia ou pedra que perdura.
Deixem-nas ser poema, poeta e rima,
deixai-as na ternura da contemplação,
olhos gastos nas luzes claras de néon.
Deixai-as erguer o seu castelo nos altos dos sonhos,
num mundo adverso, mediático e cru.
Deixem-nas ser água de birrentas lágrimas, dolorosas,
beijos, ecos da alma no desassossego e na paixão.
Deixem-nas crescer por aí, como árvores altaneiras,
na pureza simples dos dias que correm, sem pressas.


Jorge d'Alte


quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

DESFEITO

 


Eu tive a forma de um pássaro,
que voou enfrente.
Minhas asas de anjo,
foram fogo num sol poente,
escrevendo desejos cálidos no céu
Coisas!
Memórias profundas, fechadas como um filho,
crescendo no madre ventre.
Em algum lugar, meu túmulo frio,
esconde ossos,
desfeitos
pela brisa dos tempos.
Desfeitos,
Sim, desfeitos!
Poeira!
Poeira e poeiras enquanto as histórias se vão,
lágrimas frias lamentando, deslizando para os dedos,
carcomidos, e o vento dos mortos enrola minha alma
E a carne desfaz-se, esboroa-se, enquanto eu, 
estou no céu como uma alma.



Jorge d'Alte
 

segunda-feira, 30 de novembro de 2020

QUANDO FORMOS APENAS RECORDAÇÃO

 



Vamos experimentar o mel do dia,
trazer imagens de doces mares.
Remoer os sangues na ventania,
adoçar de mel  esses olhares.

Nas nuvens de suave pele,
deixar o suspiro trémulo
Sabores, cheiros, atrofiados dele,
montar a paixão, nesse cúmulo.

Desesperar em vivas marés,
cravar unhas nas suas costas,
Morder o corpo da cabeça aos pés,
deixar essas lavas ardentes, como apostas.

Vamos experimentar o mel da vida,
escrever ladainhas com um tição.
quando te sentires no amor perdida,
quando formos apenas, recordação.


Jorge d'Alte




sábado, 28 de novembro de 2020

SILABAS

 

Meu Deus, tantas silabas sibilinas,
como folhas pintadas no  agreste outono.
Nenhuma era o que a outra era,
mas ambas vingavam pelas causas perdidas
atiradas e espezinhadas nos beirais da agrura.
Silabas, 
ceia de palavras nostálgicas,
raminhos verdes, esperanças,
sol que é inferno onde não há 
outono e inverno, nem primaveras
de olhos de mel,
ou flores frouxas de seivas idas.
no verão.
Silabas,
favos guardiãs de emoções,
palavras que sugam letras
como o beija-flor suga o néctar,
no regaço da paixão.
Meu deus! Tantas palavras,
umas cruzadas na esgrima dos sussurros,
nas praias deleites do desejo.
Meu Deus! Tantas palavras,
entrelaçadas como madressilvas,
silvestres e doces.
Tantas e tantas silabas,
pelo teu corpo e alma,
escritas,
e nenhuma escreve o meu nome. 



Jorge d'Alte

NESSE DIA

 



Acordei nesse dia nas nevoas do álcool
Os nervos vivos roçavam-me a mente
como galhos tenros raspando nas vidraças.
Teus braços tive, de carícias 
promíscuas.
sons enfunados na taramelice dos mimos.


Jorge d'Alte

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

COMO

 




Como fugir,
como voar,
como viver
sem respirar.
Os ventos que levam,
as brisas que trazem,
caras que choram
não por chorar
mas por doer.
Como esconder
o medo nos olhos,
como não ver
as mortes aos molhos,
e os tristes dias 
onde não somos
senão,
corpos tenros de verão,
pés nus que já não cantam.
Como sorrir,
como saber,
como impedir
esse morrer.
Sonhos desfeitos
nas pontas do "como".


Jorge d'Alte

terça-feira, 24 de novembro de 2020

PARDOS

 


Gosto de ti porque sim.
O teu rosto assim assim,
parece goivado não na madeira 
mas sim,
no gelo de manhãs manhosas
não dormidas.
Mas és assim,
sem pingo de calor
num corpo de furor,
sem pevas de sorrisos,
como se fossem preguiçosos
no langor do faz de conta.
Gosto de ti porque sim.
Quando te recostas em mim
e me incendeias as peles,
te derretes no teu gelo
e murmuras o meu nome 
sem apelo,
vezes sem fim.
Por isso te amo mais
muito mais, do mais,
que me amo a mim!


Jorge d'Alte

domingo, 22 de novembro de 2020

SILÊNCIO DA ALMA

 





Caçando as lágrimas com o lenço
corro para lá do tempo cru
onde o amar se tornou muro
sem ouvidos nem escutares.
O silêncio virgem  toca,
na alma
despoja-a  dos sons que amo 
impõe este vazio 
meio oco
onde as vozes são mãos
passeando.


Jorge d'Alte

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

TRÊS PALMOS E MEIO NO CHÃO

 



Tranquei a porta
para sanar meus medos
meus dedos trêmulos em oração.
Lá fora as gentes sem pressa 
ou não
desmascaradas, soltam as gotículas 
da perdição.
Os ais, e os aí ais da morte, perdem-se 
em aflição. Terrível desdita
de um povo sem tino
e como destino
tem,
três palmos e meio no chão
revolvido.


Jorge d'Alte

terça-feira, 17 de novembro de 2020

ELA ERA

 

 



Ela era como linda janela

aberta para o fogo da vida

Quando o vento soprou vozes

 sem norte,

abriu-a, estilhaçou-a, e eu perdi-a…


Jorge d'Alte

 

 

 

segunda-feira, 16 de novembro de 2020

JUNTO Á RIBEIRA

 

Lá, junto à ribeira

Com a água a tresloucar

Vi teu rosto à minha beira

Teus lábios a aproximar.

Junta teus lábios aos meus

Junta à minha a tua alma

Que não seja um mero adeus

Sabores e cheiros teus que me acalma.


Jorge d'Alte

sábado, 14 de novembro de 2020

SEXO






O sol enfeixava pela janela discreta,
semicerrada,
como semicerrados estavam os olhos
turvos,
no pestanejar para o novo dia,
levando os sonhos e os seus murmúrios,
escalando agressivas,
feromonas.
Voos incrustados na ironia.
da alegria,  
carregando esse fardo,
no lóbulo do dia.
Para onde fui, não sei,
travessos lábios de sedosos 
toques, 
me corroeram o libido,
servido em peles transparentes,
afogueadas.


Jorge d'Alte



DESILUSÃO

 

A teus pés te peço
Amor,
a ternura da tua alma,
o afago dos teus olhos,
profundos,
o mar dos nossos sonhos,
esse apreço,
essa dor,
a sina da tua palma,
os meros segundos
onde a vida toca no sentir.
- Porquê essa ânsia
de voar, 
- Porquê essa ganancia
de sofrer,
- Porquê mitigar 
esse partir,
deixando-me o coração
a carpir,
no húmus da desilusão.



Jorge d'Alte

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

QUEM SE LEMBRA DELA

 




Nas secas palhas
espalhadas pelo chão
dormia a mendiga, o seu filho e o cão.
Quem se lembra dela, a pobre que pedia
na esquina torta, de mão estendida.
Pedia esmola para o seu filho
para lhe dar o sonho, no agora perdido.
A fome dela era o saciar do menino,
as prendas dele, eram feitas de mimo.
Quem se lembra dela? Já no fim da vida
numa casa de teto,
sorrindo esperanças.
Quem se lembra dela a velha mendiga,
na esquina torta de mão estendida, 
deixando a sua esmola.


Jorge d'Alte 

quinta-feira, 12 de novembro de 2020

MEMÓRIAS

 




Que gozos são esses
no tempo de então
que traziam  amor
em cordelinhos desatados, sedas
e o teu corpo nu.
Com ele me quero
a ele me dou
na cama de pétalas,
espargidas.
Olhos violetas 
me beijam os lábios
com asas de mãos 
na cintura cingida
Pobre criatura, no eu empolgado
em falas maduras, abafadas,
em cabelos de trigo 
tapando mamilos,
núbios.
Que gozos foram esses
no tempo de então
de saias curtinhas
com golas de anil
em contornos servis
onde embebeci
o corpo, a alma e o olhar.


Jorge d'Alte




terça-feira, 10 de novembro de 2020

INFÂNCIA

 


Infância de ilusões doces
onde a vida sorri no pasmo
de fadas risonhas
pinóquios e gatinhos mafiosos.
Deleites!
Passinhos atarantados e bater de pés
birrentos.
Carinhas de sorrisos fofos
arrojos de fantasias sonhadas
cor-de rosas  espoletados
nas primeiras falas. 
Mãe, Pai!
Corridas loucas sempre a crescer
atrás das letras, dos números, tretas,
Amores.
Infâncias onde somos livres.
Infinitos alcançados em cada passo
em cada dia.


Jorge d'Alte

segunda-feira, 9 de novembro de 2020

SE UM CANTO DESEJAS







Se um canto desejas
sobe á montanha de gelos pérfidos
verás como é bela essa harmonia
Deixa o vale e as noites de estio
para agarrares a lua; deleites
teus. Dos risos de amor e das mágicas falas
escreve suores de beijos rubros
fálicos. Nos sons gemebundos como vento zunindo 
apraz essa seiva que te eleva
no auge.
Nos ecos do monte á voz do trovão
solta nesse leito teu
o orgasmo.


Jorge d'Alte

domingo, 8 de novembro de 2020

BELEZA

 


De cabelos loiros
aos caracóis, debaixo da lua
seus olhos verdes  mais belos não
são promessas de fogo
na face tisnada. Dentes nevados 
sarilhos dobrados que lá
nos pensamentos perduram e encantam.
Silhueta esbelta nas sombras do dia
é corpo  de morrer que corta e esboroa na noite
cálida. Beleza tanta que chora dentro da alma
minha.


Jorge d'Alte

sábado, 7 de novembro de 2020

QUANDO




Quando á noite
os olhos fitas o céu
que vais tu procurar,
no espaço imenso
onde a lua reina
das sombras rasgando o véu?
Quando de manhã
á aurora fulgida olhas o céu
que pensas tu encontrar
no espaço férvido
onde o sol reina
das trevas rasgando ilusões?
Quando junto ao cedro
teus lábios pousas nos meus
que tentas tu desfrutar
no espasmo ávido
onde a paixão reina
dos corpos rasgando emoções? 
Quando na alvorada dos sons
me murmuras amor com os olhos
me apertas forte no teu coração
que queres tu encontrar
nos lábios rasgados da paixão.


Jorge d'Alte

NOVEMBRO

 




É Novembro de dias murchos, esmaecidos,
encharcados na tristeza da babugem das cores.
Vermelhos esbatidos, em castanhos e mel
com abelhas beijando o que restou da cor.
Um livro de nostalgia do que fora a Primavera caída
com geadas de melopeias cristalinas abraçando
a morrinha lenta e leve que molha tolos.
Tolos que não sabem ver para lá dos olhos
tolos que vivem apenas dentro de si.
Crianças de gorro e cachecol chutam 
folhas velhas apodrecidas, como aguaceiro,
e o vento mordaz leva-as no seu colo
como bebés depositando-as nos seus berços.
Lia tudo isto com as saudades do que a vida fora.
A vereda intriga-me os olhos, Paro e escuto.
Sinto os anos a passarem em solilóquios
como sinto as neves que me gelarão.


Jorge d'Alte








sexta-feira, 6 de novembro de 2020

 



O sonho era feito de folhas e mais folhas
que alguém folheava em assomos de sorrisos fáceis.
O zé estava ali de ralo bigode, galhofeiro
numa página amarelecida pelo tempo
Tinha um sonho no seu horizonte, realizado
mas partira cedo por entre as lágrimas de dores secas
deixando mais uma página no seu virar
uma página cheia de amizade.
Tenros tinham sido os tempos em que brincáramos
juntos no faz de conta.
Oh! Há aqui uma mancha, a guerra colonial
onde servira nos exércitos dos ares.
A prosa  corria vertiginosa feita de amores conquistados.
A "miúda" estava ali na página seguinte
mergulhada em véus de paixão.
Os dedos não queriam folhear mais
pois tocariam na doença roída de fumos amarelados
Algo descia por um rosto contorcido.
A nostalgia chiava sua canção dorida.
A emoção tragava os soluços que não saíam.
Para dentro voltou-se munido de negação.
O amigo não partira não pois estava ali no espelho.
O coração pulara acelerado, pasmado.
A desilusão correu o peito, e encheu as veias. 
Era apenas uma foto espelhada.
Um copo elevou-se de saudade.
Depois o silêncio oco de páginas vazias.


Jorge d' Alte






sábado, 31 de outubro de 2020

O TOCHA

 

As sombrias sombras da alvorada já não eram bem
Eram manchas de tristeza na lama da vida
Tortuosas eram as ruas com flores silvestres na ladeira
Pingos de vida aqui e acolá resmungando torcidas descaradas
Ele era o Tocha e vivia nas paredes esconsas do casario
Como desperdício misero despejado.
Tiraram-lhe a honra a alma de ser e os sonhos
Justiças cegas com mãos opulentas. e espadas vergonhosas
Deram-lhe uma pensão feita de ar e vento
De gelos e de mil e uma tormentas
Mas não lhe tiraram o seu "Eu", Tocha!
Que vivia nas paredes esconsas do casario.

Jorge d'Alte

quinta-feira, 29 de outubro de 2020

NOITES DE CETIM

 

Em noites de brancos cetins
Nas camas ricas de dossel dobrado
Na leveza da etérea alma
Trago-te até mim.
Paixão de encanto em tons de violetas
Cheiro-a com meus lábios de fome
Rolo-a agarrada a mim
Doce carraça que me pica e espicaça
Não vou dizer que subimos ao céu
Esse lugar onde as pessoas se ajoelham por pecar
Subimos ao alto onde tudo é eternidade e descoberta
Descemos tocando os túmidos com dedos de preces
Beijamos a promessa de que o mundo será nosso 
Depois da fantasia.

Jorge d'Alte

terça-feira, 27 de outubro de 2020

E VIVO

Vou em busca do vento para lhe tocar no olhar
Sem toques de afagar que posso eu fazer?
Corro nos pastos como cão em busca das palavras
Tenho-as cá dentro mas não as sei pronunciar
Colho as flores abertas como aberto é o sorriso dela
Colorido e atraente com os seus dentes alvos
Sorriso que me quis quando mais dele precisei
Sorriso que me enfeitiça, castiga e engana
Pois não era mais do que uma miragem num espelho de água
Corro prantos na noite deslavada
Sem sombras dela nem murmúrios no luar
Amo-a como minha, mesmo quando a vejo no colo dele
Porque não me consigo desligar?
Porque me vergo assim?
E de memória em memória me enraízo
Parte de mim crucia-me
Parte de mim secou
E quando a vejo passar de cabelo ao vento
Ai meu olhar de lágrimas vãs, e desperdiçadas
Estugo meus passos na sombra dela 
Sinto as fragrâncias evoladas na brisa 
Inspiro e vivo.

Jorge d'alte


domingo, 25 de outubro de 2020

POR CIMA DAS MONTANHAS...

 


Por cima das montanhas
Dos rudes alcantis
Das nuvens e do mar
Muito acima do sol
Muito acima do luar
Para além dos confins
Paira o espírito meu
Na eterna imensidade
Longe elevo o meu voo
Na alva luz do pensamento
que paira sobre a vida
E saibas compreender
A linguagem da flor
E das coisas da vida.


Jorge d'Alte

A NOSSA VEZ

 


Vamos dormir
Fechar os olhos
Breve sorrir
Estamos a sonhar
O rosto é lindo de olhos que eu amo
Papá Mamã no escuro chamo.
O sonho é quente de amor sem fim
Dentro de um corpo sempre a mudar.
Já penso e falo
Já posso andar
Com a vossa ajuda o trilho vou percorrendo
E os escolhos da vida
Pouco a pouco vou compreendendo.
Vamos dormir
Fechar os olhos
Breve sorriso
Estamos a sonhar.
O sonho é lindo de números e letras
Para trás ficaram papas e chupetas.
O sonho é lindo feito dia a dia.
Sonho é querer é luta é dor
E na bruma da noite uma flor se abriu.
Rosto amante raiado de amor.
O sonho é lindo
Cheio de quês
Juntos seguimos
É a nossa vez.


Jorge d'Alte








quarta-feira, 21 de outubro de 2020

PEQUENA LARANJA

 



A pequena laranja rolou aflita apertando seus lindos gomos como coração
Sentiu a leveza do rolar até á berma do sentir
Não sabia se chorar se rir porque nunca sentira nada assim.
Aliás nunca sentira nada de nada, nem sabia o que era sentir.
Afinal sentiu que sentira num dia de muitos dias.
Surpresa, apertou mais os seus gomos tenros e túmidos, num gesto desmedido de amor
Interiorizou o seu corpo roliço depois de ter sido flor.
Recebera o seu sêmen de pólen num entardecer de Agosto
Quando acenara as suas pétalas pintadas em seda.
Recordou esse momento de ardor de paixão
Beijou-o como só as flores sabem beijar colorindo os seus lábios com as cores do arco-íris.
Soubera que já era mais do que era quando as sementes cresceram.
Guardara-as dentro de si, para si, egoísta, sabendo que já não eram mais dela.
Por isso caíra lá do alto depois de se despedir das folhas que como berço a protegiam.
Sentiu mãos suaves pegando nela, despindo-a, soltando as suas sementes no vento da sorte.

Jorge d'Alte