segunda-feira, 25 de março de 2024

Ó BRISA QUE PASSAS

Ó brisa que passas
leva minhas folhas secas
pedaços de mim - quebrados
que não quero guardar.
Deixa a minha alma nua
ecos mudos de nós levai-os
deixai só os sonhos
estou cego pelos sonhos
pois neles posso voltar a amar-te.
Tu eras a melhor parte do meu dia
a noite em que nos embebíamos
nas chamas dos corações.
E quando nos beijávamos
eu perdia a respiração
afogado nesse mar de sentires.
Por ti voava nessa paixão
por ti amei esse sorriso
por ti sufocava na tua boca
por ti mordi na madrugada e agora?
Diz-me para onde levas os nossos silêncios
diz-me como dizer-lhe o que sinto
leva-me nessa rajada sem tino
deixa-me plantado nos seus ramos
como folha única adormecida sonhando.


Jorge d'Alte

sexta-feira, 22 de março de 2024

PRIMAVERAS

Esse perfume que sentes
que flui entre nós
é a primavera a chegar. 
Chegou e não disse nada
pois só no silêncio a podemos escutar.
Traz-me lembranças
de ti meu sorriso 
meu olhar doce
meus lábios de mel 
meu corpo sedoso.
Chegavas sempre mansamente
como o por do sol
sem som mas com paixão
e transformavas a noite
na nossa noite 
silhuetas ao luar
nuas de peles
embrulhados em lençóis tecidos
com suores e arrepios. 
Bocas carentes belezas incandescentes
mas no fundo era amor o que ansiávamos
amor que floresce como primaveras
trazendo o lindo e o exótico aos nossos olhares.
Gosto como me beijas
como rio que me arrasta
num sentimento que em mim grassa
e nos faz feliz.


Jorge d'Alte

sexta-feira, 15 de março de 2024

APAIXONADOS

Descendo a calçada 
lá vem
um anjo na madrugada
de cabelo ao vento
um torvelinho.

Tonto há pouco sonhava
esses sonhos noctívagos
onde abraçados nos demos
embebecidos e modorrentos
no beija beija 
no beija aqui 
no beija ali e pronto
as mãos tinham que vir 
desafiadoras agressivas
no passa aqui passa acolá
e a voz melodiou rouca
Afinal ela era toda seios
boca sem papas na língua
beijava-me onde estava o desejo
e eu não me queixo
pois a poesia era paixão e tesão
e rimava junto no calor dela e na minha ânsia.
As sombras sem estrelas abusavam de nós
faziam-nos fintar os medos como crianças
até que o crepúsculo vespertino nos arrancou dos linhos.

Descendo a calçada
lá vem
um anjo na madrugada
leva o meu sorriso no seu
alma desfolhada que se deu.


Jorge d'Alte

terça-feira, 12 de março de 2024

GRANIZO

Hoje caiu granizo de um céu que não é meu
plúmbeo aterrorizador como bocas ao redor
palradoras de falsos estigmas que tudo destroem 
e eu perdi-me numa cabra cega tonta
Os trilhos que eu percorro já não são
estão brancos da cor do linho mas qual é o caminho?
Como catavento o vento castiga meu corpo masoquista de amor
Abana-o num rodopio onde o norte é o sul o este e o oeste o vazio
E ali fico abananado como parvo pasmado
contando as gotas que se derretem nos meus olhos
tentando contê-las no absurdo.
È surdo o absurdo e opaco como o negro
Alma desgraçada plena de medos que  me enxota do edem
me prega no pecado quando a boca se beija vermelha e brejeira
cheia de cios e tremelejos e de se dar.
Por aí deve estar ela e o inferno pois amo-a como mel no desespero
e tudo o que eu quero ela dá num dia imperfeito antes do granizo.


Jorge d'Alte


segunda-feira, 4 de março de 2024

25 Abril 1974

Acordei num dia nublado
Apertei o meu sobretudo colarinho ao alto
A brisa sonolenta trouxe a neblina que pairava
Fantasmagóricas eram as casas de vidros húmidos
e as pessoas estugavam o passo cá fora pois havia o trabalho.
Foi nesse dia que troquei a mudez pelo cravo
que gritei na voz uma alegria  que desfazia os medos
os medos que calavam, que traziam dor e fome
Nesse dia as lágrimas eram outras num Abril diferente.
Os passos marchavam nervosos nas vozes roucas de ordens
O Povo acordara e nunca mais foi o mesmo
Ergueram as cabeças deixando-as insubmissas
Queriam um país novo sem sangue e fome.
Hoje tanto tempo depois ainda há fome nas barrigas
já não há peitos oferecidos ás balas
e os sonhos se vão como Sebastião no nevoeiro do tempo
As almas não tem fronteiras e partem na esperança
Os filhos crescem numa qualquer terra escravos da vida.
Com os olhos cansados vejo os vampiros pairando de novo
afiam os dentes de ganância
acirram e acenam promessas  que não vêm
e o povo de novo se conforma, esmagando o cravo numa ventura.


Jorge d'alte







ENCANTADOR DE LETRAS

 


 

Foi num dia de sonhos belos
que sonhei em ser mágico de palavras 
encantador de letras pois elas estava por ali.
A principio o sonho era cinza não sabia o que fazer com elas,
as letras que rabiscava no caderno machucado de linhas vazias.
Já não me lembro se havia luas ou bocados dela
nuvens vogando ou brisas de ventos imaginados.
Apenas luziam na minha mente de criança, as letras.
Os números afligiam os meus dedos e contas ficavam para mais tarde.
Mesmo assim juntei três letras pequeninas mas eram enormes de amor.
MÃE
E foi este o meu primeiro poema
pois uma mãe é luz, é sorriso, verdade, apoio, é amor.
por isso misturei as letras, sopa de sentires
imaginei-a como um sol grandioso
fonte de vida
um porto seguro onde me refugiar
das tristezas que nos roem, das dores, dos medos
e escrevi "amo-te".
Olhei o tamanho do mundo e escrevi "Imenso"
depois lembrei-me de tudo o que me deu
escrevi  "coração" com a ponta dos meus olhos
com o sabor do meu peito e escrevi "mar"
quando chorei possesso pelo alcance da minha força.
Mãe é tudo o que se pode contar num poema
Todos os sentimentos estão nas sua letras
estão na saudade da ausência
estão no meu sangue em cada célula que me deu.

Mãe amo-te imenso
o teu coração é um mar
onde navego seguro e amado.


Jorge d'Alte