sábado, 27 de abril de 2024

NENHUM GUERREIRO CAMINHRÀ SÓ

Foi num dia como este
com o mar a encolher-se nas praias
com o vento calado pois nem a brisa corria
que o por do sol em caracol desceu até apagar-se.
Foi nesse momento que que empunhei a minha voz
gritei nas sombras o meu medo e o meu fervor
e quando a lua de mil caras apareceu
escolhi o caminho o meu e o de tantos
e marchamos com cravos
enchemos as armas com eles
e de braços dados  conquistamos a rua
e gritamos numa só voz
"nenhum guerreiro caminhará só".



Jorge d'Alte

terça-feira, 23 de abril de 2024

SEMPRE NOS AMANDO

Não foi o galo
Não foi o sino
acordei quando a senti
levantar-se levando com ela
a noite até ao dia.
Como era linda com face de madrugada
sentada agora no degrau da escada
pensativa num sorriso irónico
olhando os campos ainda com geada.
Olhou-me numa interrogação muda
convidou-me com o eco da montanha
num furtivo sorriso malandreco.
Sentei-me e dei-lhe a mão travessa
acariciei-a e senti-a reviva
beijei-a como beija flor.
O leque abriu-se num arco iris sem cor
os sentimentos fugiram até á boca
perduraram ali colados em paixão
até o sangue acerbar a ansia do coração.
Largou-me correndo maliciosa
até nos encontramos no futuro
rugosos e lamechas
mas sempre nos amando.


Jorge d'Alte

domingo, 21 de abril de 2024

LIBERDADE







Abracei-a com os meus braços
corpo franzino tisnado
Parecia dormir
quem seria
que nome tinha
quem a amava
quem mimava
esta cara pequenina.
Embalei-a nas minhas lágrimas
num sol fascinante indolor
cantei-lhe uma canção minha
numa língua que não era a dela.
Perguntei-me 
que sonhos teria
de quem gostava 
quem seriam os seus amigos
de quem seria o livro
que segurara com suas mãozitas
O "Aprendendo em Liberdade" 
era o seu titulo.
Nunca saberia o que isso era
pois agora amarelecia.
Seus cabelos longos negros  
esvoaçavam numa brisa.
Imaginei-a correndo com a alegria
num sorriso enorme cheio de vida
na escola lendo  rindo brincando
mas ali estava ela nos meus braços
parecia dormir quando a dor lhe fugira
Talvez os seus sonhos ainda vivessem
e nesse céu que é de todos
corresse de nuvem em nuvem
de mãos dadas com a cor
no meio das searas 
no meio das flores
gritando na sua voz clarinha
Liberdade.


Jorge d'Alte







sexta-feira, 19 de abril de 2024

OS OLHOS

Os olhos eram olhos
eram dela eram meus
amaram-se na noite escura
entre beijos e escolhos
entre abraços de romeus
e caricias que a mão procura.
Eram olhos que se amavam
eram olhos  assustadores
eram poços de amor dorido
mas quando sorriam
eram lábios sedutores.
E quando eu os beijei perdido
fiquei rendido
fiquei amordaçado
com palavras no ouvido
com o sonho traçado.


Jorge d'Alte

quarta-feira, 17 de abril de 2024

TRÁS A TUA VOZ DE ABRIL

Vem á janela 
trás tua voz de abril
enche as ruas na luta surda
pois os velhacos estão aí
escondidinhos e mortinhos
por deitar a mão á democracia.
Levanta a tua bandeira
empunha a tua voz como cruz
desfila de cabeça erguida
como fizeram os nossos avós.
Deram-nos a esperança
o podermos sermos nós
o podermos falar livremente
sem censuras e grilhões.
Vem á janela
Trás a tua voz de abril
grita a tua revolta
dá o braço a um amigo
canta Vila Morena
e marcha nesse dia
calca as sombras maléficas.
Vem á janela
Abril está na rua
Abril está na luta.


Jorge d'Alte

segunda-feira, 15 de abril de 2024

TREVAS NUM DIA ESCURO

Muito tempo vivi nas trevas
ajustei os olhos até elas serem minhas
meus olhos cegos conseguiam ver
esse mundo que trazemos escondido
essa amargura que nos destrói.
Gostava de ser uma borracha
que apagasse essa tristeza desse olhar
ver a cor desses olhos brilhando nos meus
ver o sorriso desenhar-se nesses lábios
ver a alegria pular como pardalito 
num leque perfumado de sentires.
Perco a respiração quando a almejo
calçada abaixo como gaiata
Sinto que estou a desaparecer dos seus olhos
talvez porque vivo nas trevas
é assim que o seu olhar acaba
morrendo no negrume até que um dia
eu vença esse escuro sacuda minhas folhas secas
saque das raízes o amor e viva.


Jorge d'Alte

domingo, 14 de abril de 2024

ATO

A mão pega na tua
estremeces no toque
Ofereces o sorriso
Guardas os lábios
Mais tarde vês-te nua
vês a cara dele em choque
dás-lhe a tua pele de improviso
céu e estrelas como pálios
abres-te como flor a abrir
sentes a paixão a abraçar-te
e como arte murmuras
num ouvido que te quer escutar
O ato deixa-te prestes a parir
desejos que te caçam como enfarte
e tudo aquilo que procuras
deixa teu coração arrulhar.
Depois vem aquilo que veio
e de permeio ficas saciada
prostrada nas nuvens creio
feliz e amada.


Jorge d'Alte
 
 

sexta-feira, 12 de abril de 2024

POR VEZES TEMOS DE PARTIR

Por vezes temos de partir
mesmo quando queremos ficar
desistimos do que nos dói
mas a dor vai vingar do outro lado de nós.
O adeus são alturas que nos mordem
levando um pouco do que somos
sem beijos e abraços.
Lágrimas são tristezas que tecemos
sem carinhos nem afagos
apenas o vazio sobrevive
em novos passos titubeantes.
A boca seca
os olhares murcham
a realidade choca
a alma mirra
mas a vida continua.


Jorge d'Alte

quinta-feira, 11 de abril de 2024

ERAM SINOS

Eram sinos a badalar
era a morte que gritava
entre a terra e o céu.
Eram toques fortes 
que encolhiam a criança
sem olhos para chorar
nem sonhos para engolir
Pai e mãe estavam a ir
e ela não tinha passos
fora pregada ao chão
era o seu mundo que ruíra.
Soube o que era a tristeza
a dor que se agudizava no seu intimo
Sem voz chamou cada um deles
esticou os braços sem abraços
beijou-os no silêncio do vento.
Alguém lhe deu a mão
fora uma mão suave numa voz doce
Soube nessa altura que teria um peito
alguém que a ajudasse a viver na saudade.



Jorge d'Alte

terça-feira, 9 de abril de 2024

SE A DOR VIER

Se a dor vier mesmo antes de amor morrer
não me a arranquem deste corpo inerte
deixem-na ficar aí - memórias de uma partida
saudades de um adeus que acenou nos olhares
melancolia que não canto, tristezas que rejeito
ai meu peito dividido  no coração
e como oração me incendeiem no por do sol
me retirem as farpas, me lancem no mar
sopa de vida onde tudo começou
Sarem-na com amizade
tragam-me de volta
envolto em amor
e como tudo o que se solta lancem-na no vento
talvez no firmamento ela esteja a chorar
estas gotas pequeninas salpicadas de sal
que lavam os sentimentos e nos fazem sofrer.
Se a dor vier
abracem-me
se a dor doer
afaguem-me
se  o pranto vier
deixem-no calar
se os olhos se cerrarem
cantem comigo
este adeus de que morro
o meu grande amigo.


Jorge d'Alte



segunda-feira, 8 de abril de 2024

HOJE VIERAM

Hoje vieram de África as poeiras
as tais malditas que levaram o Rei
Carpiram as mulheres junto ás praias
gritando o nome do seu soldado
lacrimejaram os olhos nas rugas dos homens
no horizonte avermelhado
A desgraça trouxe a fome 
horrores sem fim
trouxe humilhação
uma coroa ao Deus dará
a pata do rei do lado.
Hoje vieram de África as poeiras
sufocaram as gargantas
caíram como chuvas de lama
mas não trouxeram o nosso rei
mas sim uns papalvos armados
promessas vãs 
que nos deixam lixados.


Jorge d'Alte

terça-feira, 2 de abril de 2024

UMA MEMÓRIA

As pingas que pingavam a meus pés
não eram de chuva mas de lágrimas
cavavam na terra seca covas da minha tristeza
eram cristalinas de extrema pureza
pois a dor que me acometia de lés a lés
era profunda como laminas de esgrimas.
Sequei-as com memórias
dos tempos que eram passado
separei o trigo e o joio na alma
Milhentas e milhentas histórias
contei-as a mim mesmo com agrado
mas dos rostos há só um que me acalma.

Inventei-o um dia no meio do amor
quando sonhei acordado ao seu lado
uma vida longa sem demónios nem anjos.


Jorge d'Alte