domingo, 30 de julho de 2017

Serras














Pequenos montes de serrania onde a vinha escorrega
esbravejando pela míngua gota que dorida cai
onde oliveiras seculares se agarram em desespero
entrelaçando suas rijas raízes por entre pedras de terra
e como numa ilusiva entrega
cachos de uvas crescem como tempero
doando seu aroma etílico a esta serra
e por ali e aí
a amendoeira acena
prendendo a nossa atenção
mas com toda a pena
lhe digo que só é bonita na floração.
Agora escuto a figueira
e mesmo que não queira
o zimbro selvagem é o rei da região
e no vento que sopra do suão
vem a promessa de chuva bendita
que começa a cair, em pinga pinga fortuita
que se evapora e eleva nos ares
como doce aroma de maresia de distantes mares.


quinta-feira, 27 de julho de 2017

SUBLIMAÇÂO















Quero um céu cheio de luz,
que esconda mistérios indesvendados,
tape a beleza com astros nus,
me traga redondos em vez de quadrados.
Me faça girar rodopios de mudança,
olhos de ver como cegos,
que tudo está naquilo que se alcança,
que sublima no êxtase, nossos egos.


Jorge d' Alte


terça-feira, 25 de julho de 2017

O beijo nos teus sonhos!









Os olhos fecham-se devagar
Os lábios aproximam-se tocando-se
Nos olhos fechados uma luzinha veio para ficar
De novo vêm os lábios encantando-se
que se esmagam  num carrossel de emoções
Os corpos agora girados e abraçados
são pequenos nós  atados
cheios de ligações
As línguas se abraçam numa disputa
e os sentimentos preparam-se na alma para essa luta
Como balões sobem, sobem e rebentam
cada vez mais alto, cada vez mais loucos
e a loucura apodera-se em soluços roucos
em canções que os lábios inventam
e de repente
num clímax diferente
os corpos são paz depois da dor
e nos semblantes
agora em cores brilhantes
se escreve devagar a palavra "amor



Jorge d'Alte

sábado, 22 de julho de 2017

ONDE ESTAVAS TU









Onde estavas tu
quando o dia nasceu
quando a madrugada caiu
quando a noite desapareceu?
Onde estavas tu?

Onde estavas tu
quando a tristeza caiu
quando o sangue gelou
quando o teu aroma se esvaiu?
Onde estavas tu?

Onde estavas tu
quando tua voz não se ouviu
os teus passos se foram
quando a angustia pariu?
Onde estavas tu?

Onde estavas tu
quando a solidão chegou
quando os ecos se calaram
quando a alma se quebrou?
Onde estavas tu?




Jorge d'Alte



terça-feira, 18 de julho de 2017

COPOS








Um copo reluz
no meu horizonte encurtado
o seu aroma seduz
num sabor doce e frutado.
O calor ardente cai, subindo prenhe como um balão
adormecendo os sentidos
e de repelão
mesmo adormecidos
os sonhos fluem com o seu contar
ferem a memória
obrigam-nos a estremunhar.

Essa etílica história
que o copo contou
cai de novo no abismo em goles trágicos
mas apesar de cair, de novo se elevou
em vapores de sonho e momentos mágicos




Jorge d'Alte


sexta-feira, 14 de julho de 2017

O LIVRO











Capa bolorenta
rendada pela traça
chora letras desfeitas
em frases estragadas.
A curiosidade sedenta
extravasa essa taça,
cura essas maleitas
seguindo-lhe as pegadas.
Olhos de grossos vidrados
deglutam esses travos
de amores perfeitos,
enleiando-se aos bocados
fios de teia de agravos
e de apetites satisfeitos.
Dedadas marcam o rumo
das páginas volteadas,
eivadas de comoção,
iradas como pleitos,
amareladas pelo fumo
sofridas de solidão,
num fim batido de abas fechadas.


Jorge d'Alte



quarta-feira, 12 de julho de 2017

ERAM







Eram ouvidos que aqueciam
pedras geladas de outras eras.
Eram palavras que agasalhavam
essa atmosfera balofa de mordomias,
e a mão altiva estendida
para diante, refulgia no seu enorme rubi,
onde lábios selados osculavam sedosas peles.
As vestes de mil folhos de rendados
rodopiavam danças já mortas,
onde encontros de pecados
caiam em hipócritos sorrisos,
e as voltas trocadas em passinhos
frementes, eram risos abafados que
sorridentes, desfaleciam em alcovas brancas,
de linhos.
As paredes sideradas por tantos
segredos, escorreram tantas lágrimas
e medos aí gravados e que hoje ali sentadas,
desfiam no cuscar bisbilhoteiro,
historias proibidas embuçadas em lendas,
que escaparam dos fogos redentores,
de uma qualquer inquisição.


Jorge d'Alte



segunda-feira, 10 de julho de 2017

QUENTES E BOAS







No evolório cinza,
redemoinhado, batido e fumado,
apregoa em voz roufenha
a boa castanha.
As quentes e boas
estralejam no sal,
num presunçoso olor
embrulhado, em cónicas folhas
de palavras rasgadas, de jornal.


Jorge d'Alte


domingo, 9 de julho de 2017

VELHICE






Mirrado e seco
como corpo pregado
numa qualquer cruz
de pés de barro.
Senta-se na soleira
sente-se num beco
como troco fiado
como ácido pus.
E como um escarro
é um velho sem eira
esperando sua sorte
nos lábios da morte.


Jorge d'Alte

terça-feira, 4 de julho de 2017

O TLIM






O tlim caiu no boné do chão
como pinga chuvosa que dá vida ao solo.
O cheiro de pão fresco era outro som
que redemoinhava cá dentro,
como gases no estômago vazio.
Algures numa qualquer abadia,
o tlim era barulhar de talheres.
(que esta refeição, seja repartida pelos pobres deste mundo)
Lançada a bênção numa imaginativa cruz,
contente o abade, mais o padre, mais o bispo,
escorriam baba incontida no guardanapo,
em bochechas tintas do inebrio.
Na cidade das decisões, o tlim tocou noutro tom,
entrou num bolso roto
que a ganância furou.
(Luvas e sacos verdes inventou)
Sonhava megalómano TGVs e afins,
ficar na história como herói da altivez.
O banqueiro, esse tlintava esfregando as mãos.
Tantos tlins que choviam mas que não molhavam o chão,
caíram como rios inundando contas.
(Spreads, juros e penhoras ordenou)
A puta da rua escura o tlim colheu.
Meteu-o no meio de mamas e assim cresceu.
O fisco que se foda, pois aqui quem fode sou eu!
(Hiv, siflis e outros pratos serve sem qualquer controlo)
O maroto do tlim não mais tlintou.
O boné vazio, o pobre olhou.
O abade benzeu-se, o diabo do tlim bazou.
O político danado ao tlim decretou.
O banqueiro para tlintar, juros aumentou.
A puta de pernas abertas ao tlim blasfemou.
Por fim o tlim foi-se como veio,
já não é som que tlinta,
agora é remedeio na barriga aflita
e a mão estendida é toda uma nação.
Porque um dia os políticos acordaram,
gostaram deste som e enfardaram
e tlim para ali e tlim para acolá,
e agora a merda do tlim, já não há.


Jorge d'Alte






                                                                   

AQUELA MIÚDA







Vejo um imbecil
sentado por aí,
não dá conta do tempo
do que se passa em redor
com cara de quem acaba
de levar, com um ferro de engomar na cabeça.
Talvez sofra de um sarilho com mulheres!
Está escuro como tudo,
chove, faz frio e em qualquer ponto do céu
ouço uma voz a chamar.
Não me preocupo muito,
pois penso numa miúda meiga,
tem tudo quanto se possa imaginar
e fantasiar.
Ela é a prece deste coração errante!
Porque não contar novas
da geografia desta menina?
Mediana, com curvas como ninguém viu
em nenhum compendio de geometria.
Olhos azuis profundos…
misteriosos…
que quando nos olha
faz-nos sentir cobras pela espinha, acima.

Jorge d'Alte






SINTO







Sinto
o meu horizonte cada vez mais curto
A vontade
tenta enganar este corpo ressequido
onde o coração bate
seu tic tac continuo
Cada tempo passado
cada segundo vivido
deixam esta marca de solidão
e então pergunto-me
porque respiro?


Jorge d'Alte


domingo, 2 de julho de 2017

PATÉTICO SER





Patético ser
que um dia em ciúmes clamou
que a dama era só e apenas dele
e para eu saber
teclou, teclou
baboseiras sem nexo
e eu perplexo
lhe perguntei
que ser abjecto era aquele
que confundia amor com posse
pois o mísero não compreendia
que por tudo o que eu fosse
a minha amizade, nunca seria, de apenas um dia.


Jorge d'Alte