quarta-feira, 10 de novembro de 2021

A ÚLTIMA FLORESTA

Sou a árvore mais antiga  
o rei da floresta
Do meu alto canto a cantiga
ao sol que me cresta.
Vivi no limbo da Terra
crescendo, amando e sentindo
e neste capítulo que me encerra
sinto a minha parca seiva diluindo.
Olho os meus vizinhos os meus queridos filhos
todos mortos
todos tortos 
maltrapilhos.
Minhas raízes outrora fortes
já não mamam no humos e no subsolo
tenho o corpo rachado em mil cortes
dói e gemo conformado como um tolo
Já não tenho resinas nem orvalhos para chorar
nem as vestes de folhagem
Já não sinto o meu adejar
nem os olores na aragem.
Onde estão a mil vozes de pássaros cantando
debicando meu tronco com agrado
num frenesim batendo asas bailando
num festim de larvas em que me degrado.
Hoje será o último pôr do sol que vejo
o último céu que arde sem nuvens molhadas
Sem nova madrugada que invejo
aperto minha seiva no meu colo e bebo-as amortalhadas.



Jorge d'Alte












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