terça-feira, 8 de setembro de 2020

AMOR NA MORTE

 

A neve voava atroz, gritando hinos de medo no vento que voava de oeste.

A tormenta endoidecida cavava através dos altos caules dos asbestos, um caminho que não sabia.

A casa pardacenta e descolorida gracejava ironias sobe o penhasco que quase a envolvia.

A sombra tolhida de um homem movia-se dançando por detrás das velhas cortinas

Talvez alheado de tudo tentando caçar espasmos de emoções diluídas.

Vivia agarrado á solidão.

As memórias esbatidas daquele rosto curtido eram como estalactites suspensas

Umas vezes pingavam e outras não deixando no seu coração poças e resquícios bolorentos

Lágrimas idas chupadas no tempo e alagadas no fel do seu corrosivo sofrimento.

O rosto fértil de rugas cavadas iluminava-se na áurea do belo e o seu sorriso cavernava branco e singelo.

A vontade do dever levantou-o até ao quarto semiescuro onde ela parecia dormir.

Olhou-a a bom ver e debruçado beijou-a na testa fria de mil e um nevões.

Embrulhou-a em alvos panos e levou-a nos braços fortes como se a levasse risonha até ao seu leito nupcial.

Por momentos a tormenta era acalmia enquanto ele descia

Cambaleante a ladeira de neve fofa.

Uma cova desenhava-se na brancura tremenda.

Um pequeno pinheiro fazia sentinela ali mesmo.

Depositou-a lá dentro cheia das suas lágrimas ficando ali sentado esperando.

Foram encontrados quando as flores romperam no seu ciclo de vida.

Sentado na erva que crescia um corpo rígido e sentado ornado de flores parecia sorrir.

Olharam-no de olhos vidrados deixando o mistério acontecer.


Jorge d'Alte



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