Sentiu então uma brisa fluir da areia
quente
Ouviu a água gorgolejar mais abaixo quando
pousou a mochila no chão
Olhou para cima enquadrado entre as
estrelas parcas
Como pontas luminosas de armas
apontadas para ele
Estendeu a mão perdida como se
agarrasse as sombras escorridas da esperança
Um meteoro incendido riscou no
horizonte como aviso
Pedras tumulares errantes luminosas a
fazerem coalhar o sangue
Sentiu o arrepio e pensou – quanta
areia cabe numa mão?
Tudo se esvai como areia pelos dedos
da vida
Engoliu com a garganta seca. Sentiu a
areia raspar-lhe doce a mão
Sondou a escuridão mais distante com
os seus sentidos
Aves? Uma queda de areia! Criaturas
no meio dela mas não Tu
A luz das estrelas afastava apenas o
suficiente da noite bela
Cada sombra era uma ameaça. Manchas
de negrume que amordaçava
Uma lembrança cega -pensou! Sons como
alcateias de gritos na alma
A minha dor é mais pesada do que as areias dos
mares
Por isso aqui estou no momento só
sofrendo a agonia como Deus sofreu
Este mundo esvaziou-me de tudo – a
vida de amanhã
Sentiu a areia prender-lhe os pés
como correntes chocalhando quando descia
O cadafalso! Olhou para o norte por
cima das rochas desbotadas de sombrios
A longa vergastada veio com o frio
trepando pelas pernas cheias de água
A mochila escorregou de periclitante
equilíbrio rolando para ele como para o agarrar
Mas a voz de sempre não veio
encher-lhe as veias de seiva ardente
Nem os ouvidos de sussurros mordentes
e olhares de cios
Deixou palavras desenhadas trémulas
no papel amarrotado como lágrimas de dor aberta
Deu um passo longo sem areia nem
choros de estrelas nem cânticos de sereias
A noite cega afogava-lhe as lágrimas
salgadas devastadas,
Como a água que o empurrava para
areia em cada vaga; gemia e cantava
Tentando demovê-lo da fúria amarga
que o consumia
Desespero como chama negra e opaca
trespassando-o como espada consagrada
Ouviu o silvo por cima quebrando na
onda como canção de rouxinol em voz amada
Sorriu conformado a água que o
afogava em cores tétricas cheias de morte
A voz amada que em desespero o
chamava rasgando trevas e banho de luar
Chegara atrasada - soou como
borbulhar de ar que lhe comia os pulmões
O sorriso deslizou na sua face dorida
apagando-se – Tudo poderia ter sido mas não foi
Por isso morria no eco que o gritava
no alto da crista
Enquanto o mundo que fora se
estilhaçava e o absorvia.
Jorge d’Alte
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